terça-feira, 29 de maio de 2012

Quem escreveu a bíblia? (parte 5 de 5)

Escrituras em séries:
               Tudo isso mudou após a invenção da impressa, em 1455. Agora ninguém mais dependia dos copistas para multiplicar os exemplares da bíblia. Por isso, o grande foco de mudanças no texto sagrado passou a ser outro: as traduções. Em 1552, o pastor Martinho Lutero usou a imprensa para divulgar em massa sua tradução da bíblia, que tinha feito direto do hebraico e do grego para o alemão. Era a primeira vez que o texto sagrado era vertido numa língua moderna - e a nova versão trouxe várias mudanças, que provocavam a igreja. Logo depois um britânico, William Tyndale, ousou traduzir a bíblia para o inglês. No NOVO TESTAMENTO, ele traduziu a palavra ECCLESIA por "congregação", em vez de "igreja", o termo preferido pelas traduções católicas. A mudança nessa palavrinha era um desafio ao poder dos papas: como era protestante, Tyndale tinha suas diferenças com a igreja. Resultado? Ele foi queimado como herege em 1536. Mas até hoje seu trabalho é referência para as versões inglesas do livro sagrado.
               A bíblia chegou ao nosso idioma em 1753 - quando foi publicada sua primeira tradução completa para o português, feita pelo protestante João Ferreira de Almeida. Hoje, a tradução considerada oficial é a feita pelo Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e lançada em 2001. Ela é considerada mais simples e coloquial que as traduções anteriores. De lá prá cá, a bíblia ganhou o mundo e as línguas. Já foi vertida para mais de 300 idiomas e continua um dos livros mais influentes do mundo: todos os anos, são publicadas 11 milhões de cópias do texto integral, e 14 milhões só do NOVO TESTAMENTO.
               Depois de tantos séculos de versões e contraversões, ainda não há consenso sobre a forma certa de traduzí-la. Alguns buscam traduções mais próximas do sentido e da época original - como as passagens traduzidas do hebraico pelo linguista David Rosenberg na obra O LIVRO DE J, de 1990. Outros acham que a bíblia deve ser modernizada para atrair leitores. O linguista Eugene Nida, que verteu a bíblia na década de 1960, chegou ao extremo de traduzir a palavra "sestércio", a antiga moeda romana, por "doláres". Em 2008, duas versões igualmente ousadas estão agitando as escrituras: a GREEN BIBLE (bíblia verde, ainda sem versão em português), que destaca 1.000 passagens relacionadas à ecologia - como o momento em que Jó fala sobre animais - , e a bíblia ILLUMATED (bíblia iluminada, em inglês), com design ultramoderno e fotos de celebridades como Nelson Mandela e Angelina Jolie.
A bíblia se transforma, mas uma coisa não muda: cada pessoa, ou grupo de pessoas, a interpreta de uma maneira diferente - às vezes, com propósitos equivocados. em pleno século 21, pastores fundamentalistas tentam proibir o ensino da teoria da evolução nas escolas dos EUA, sendo que a própria igreja aceita as teorias de Darwin desde a década de 1950. Líderes como o pastor Jerry Falwell defendem o retorno da escravidão e o apedrejamento de adúlteros, e no Oriente Médio rabinos extremistas usam trechos da Torá para justificar a ocupação de terras árabes. Por que? Porque está na bíblia, dizem os radicais. Não é nada disso. Hoje, os principais estudiosos afirmam que a bíblia não deve ser lida como um manual de regras literais - e sim como o relato da jornada, tortuosa e cheia de percalços, do ser humano em busca de Deus. Porque esse é, afinal, o verdadeiro sentido dessa árvore de histórias regada há 3 mil anos por centenas de mãos, cabeças e corações humanos: a crença num sentido transcendente da existência.

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